sexta-feira, 29 de abril de 2016

Negro e afeminado, Liniker é a nova voz da MPB


29/04/16
Coluna: Ultima Nota
Autor(a): Jean Pierry Leonardo


Com apenas 20 anos, Liniker, o jovem cantor e compositor de Araraquara, no interior de São Paulo, vem alçando vôos cada vez maiores desde o lançamento de “Cru”, seu primeiro EP, em outubro passado.

Com uma voz rouca e potente, Liniker – nome de um famoso jogador britânico que brilhou em uma Copa do Mundo, anos antes do artista nascer – impressiona pela personalidade e pela naturalidade ao cantar. De família de músicos, ela bebe da fonte mais pura da Black Music e da Soul Music, assumindo com muito orgulho suas raízes afro. É difícil não contagiar-se pela sonoridade acústica, teatral e límpida das três músicas que compõem o EP: “Zero”, ‘’Caeu” e ‘’Louise du Brésil”. Aliás, orgulho é a palavra-chave de si. Quem já o conhece da internet, já está acostumado com o swing e beleza que é assisti-lo, mas para os  mais desavisados, não estranhe nada daquilo que assistir.


“Sou negro, pobre e gay e tenho potência também”, são suas sinceras palavras. E é muito bonito ver como Liniker quebra e rompe barreiras do politicamente correto, fazendo de seu corpo tão teatralizado (ele é ator de uma companhia de Santo André, em SP) um instrumento de luta. Brincos, batom, saias, turbantes, colares e muita feminilidade fazem parte de seu dia a dia, desde o despertar de sua sexualidade. Essas características dão ainda um toque todo especial em seu lado artístico, pois quem à primeira vista olha e o julga apenas pelo que veste, “morde a língua” quando o ouve cantar. Outro ponto alto de seu trabalho diz respeito a sua banda “Liniker e os Caramelos”, formado por ótimos músicos, também jovens, e com um trio de backing vocals maravilhosas. “Um dos meus maiores desejos como artista é: bote para fora quem você é, não tem problema”, diz ele.

Sem dúvidas, Liniker já afirma-se como um dos mais primorosos e promissores nomes da Música Popular Brasileira (MPB), com uma unicidade que, talvez, desde Ney Matogrosso não víamos. Num momento tão opressor e complicado social e politicamente falando, o jovem surge como uma voz de esperança e simbolismo para milhares de outros jovens negros, gays e periféricos, que agora podem vislumbrar chegar onde ele está chegando, sem medo ou culpa daquilo que é. Num gênero musical que por muito tempo padeceu de novos artistas, numa natural evolução musical – infelizmente nosso(a) Caetano, Chico, Gal, Bethânia e etc não são eternos – Liniker é um sopro de novidade e resistência também, somando-se a outros tão bons e performáticos cantores como ele, casos de Felipe Catto e Jhoony Hooker, por exemplo.



Portanto, assim como Liniker, dispa-se de seus preconceitos ou resistências, e descubra novas possibilidades musicais. Sua intenção não é desmoralizar a “tradicional família brasileira” com seu jeito de ser, afinal ‘’o corpo é meu. Eu que tenho liberdade sobre ele. Se tenho minha inteireza, por que você quer colocar seu bedelho em mim? Quem é você para ditar regras que eu tenho que seguir? Cada um é cada um, cada corpo é uma história’’.

Imagens: 
1 - Lilo Clareto 
2 - Leila Penteado/Divulgação