domingo, 5 de julho de 2015

VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

05/07/15

Você já ouviu falar em VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA? Pode ser que para você seja um termo desconhecido, assim como era para mim até alguns dias, quando comecei a conversar com uma amiga (e vítima) a respeito.

O termo pode até ser que nos dê uma noção do que se trata, mas certamente não nos remete à dimensão exata do que verdadeiramente acontece com muitas mulheres, nesse que deveria ser um acontecimento de plena realização e felicidade, o momento de dar à luz a uma nova vida, gerada dentro de si. 

 A gravidez é uma fase da vida da mulher em que ela se prepara ansiosamente para o momento do parto, cuidando de cada detalhe para a vinda do bebê e contando os dias para a sua “boa hora”. Além disso, é um período em que fica mais frágil, necessitando de cuidados, carinho e atenção. Imagine passar todos esses meses com os melhores pensamentos, pensando na dor, sim, inevitável nesse momento, mas certa de que essa dor é passageira e o resultado só lhe trará felicidades. Mas e se, nessa hora tão aguardada, e quando fica mais vulnerável, você chega na maternidade e se depara com descaso, maus tratos, partos acelerados, dores elevadas a níveis desnecessários, humilhações, dentre outros absurdos, e ver o que era para ser um momento feliz tornar-se seu pior pesadelo, trazendo consequências traumáticas físicas e psicológicas por toda a vida. Acredite, isso é mais comum do que se imagina, acontece, segundo estatísticas, com pelo menos 25% das parturientes no Brasil, fora os casos em que a grávida nem tem consciência de que sofreu abusos, e não denuncia, ficando de fora desses números.





Afinal, o que caracteriza a VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA?

A principal queixa de violência cometida, e que podemos encarar muitas vezes, como natural, e não é, é a recusa dos hospitais em acatar o direito que toda mulher tem a acompanhante no momento do parto e pós-parto imediato. Há casos de não haver recusa, pois sequer é informado à gestante essa opção, que em muitos casos, desconhece seus direitos. Veja o que diz um trecho da Lei 11.108 de 07/04/2005:

“Os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde - SUS, da rede própria ou conveniada, ficam obrigados a permitir a presença, junto à parturiente, de 1 (um) acompanhante durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.
§ 1o O acompanhante de que trata o caput deste artigo será indicado pela parturiente”.

Há outros tipos de violências e abusos cometidos na hora do parto. Alguns deles são (retirados de material explicativo da Defensoria Pública de São Paulo):


  •     Recusa na admissão em hospital ou maternidade (peregrinação por leito);
  •     Procedimentos que incidam sobre o corpo da mulher, que interfiram, causem dor ou dano físico. Exemplos: soro com ocitocina (medicamento para acelerar o trabalho de parto, que aumenta as contrações e eleva as dores a um nível mais intenso que o normal. Em muitos casos ficou comprovado que a ocitocina é perfeitamente dispensável), toques sucessivos e por diferentes pessoas, privação de alimentos e água, episiotomia (corte entre a vagina e o ânus), imobilização, etc.


    • Ações verbais ou comportamentais que cause na mulher sentimentos de inferioridade, abandono, instabilidade emocional, medo e perda da integridade e dignidade
    • Cesariana sem indicação clínica e sem consentimento da mulher;
    • Impedir ou retardar o contato da mãe com o bebê logo após o parto, muitas vezes em períodos longos;



    • Impedir ou dificultar o aleitamento materno.

    Além disso, podemos destacar ainda, conforme muitos relatos assistidos em pesquisa para este artigo:
    • Procedimento de Tricotomia, caracterizado pela raspagem dos pelos pubianos, sem o prévio consentimento da mulher, processo doloroso para o momento e sem nenhuma indicação clínica, portanto, perfeitamente dispensável;
    • Forçação de parto normal, mesmo em condições naturais não indicados, como o peso e o tamanho do bebê e condições físicas fragilizadas da gestante, que pode acarretar em danos físicos à mãe e à criança, e altos níveis de sofrimento prescindível. 

     O que diz a OMS (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE)?


    Em setembro de 2014, a OMS publicou em seis idiomas diferentes a Declaração contra a Violência Obstétrica, documento que visa estabelecer a “prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus tratos durante o parto em instituições de saúde” e faz sérias exigências quanto a medidas sérias a serem tomadas com relação à violência no parto, como “maior apoio dos governos e de parceiros no desenvolvimento social para a pesquisa e ação contra o desrespeito e os maus-tratos” e “produzir dados relativos a práticas respeitosas e desrespeitosas na assistência à saúde, com sistemas de responsabilização e apoio significativo aos profissionais”.

    Para ler a íntegra do documento, clique aqui.

    Iniciativas Individuais:

    Em paralelo, existe, felizmente, uma gama de ações surgindo recentemente a fim de combater e principalmente descortinar esses abusos sofridos, visando romper o silêncio das vítimas, incentivando-as a falar sobre esses traumas sofridos e conscientizar outras grávidas sobre seus direitos, para que as violências não se repitam.

    Exemplo disso é o trabalho da fotógrafa Carla Ratier, o Projeto 1:4: retratos da violência obstétrica, que traduz em imagens o sofrimento de algumas mulheres. No decorrer desta coluna foram exibidas imagens desse trabalho.




    E na semana que vem, continuaremos com o tema aqui no Mulher Manifesto. Lembram daquela amiga que comentei no início da matéria? Ela se chama Amanda Alves, e nos dará uma entrevista exclusiva contando o seu caso. Como erro e violência médica na hora do parto quase fez da pequena Maria Eduarda uma vítima fatal, e lhe trouxe problemas físicos que, após dois anos, ainda não foram sanados? Não percam!!



                                                                                    






    Imagens: site  m de mulher (Abril) , arquivo pessoal Amanda Alves